Resenha Crítica - Rota 66
- Rafaela Ponchirolli
- 18 de mai. de 2018
- 5 min de leitura

O livro Rota 66 é uma obra do jornalista Caco Barcellos, feito pela editora Globo e publicado em 1992. Cláudio Barcellos de Barcellos, mais conhecido como Caco Barcellos, nasceu em Porto Alegre, onde tardou em começar seus estudos e foi taxista por vários anos. Ele cursou a faculdade de Matemática para ser Engenheiro Civil. Dois anos e meio depois, optou para Jornalismo. Formou-se em 1975 pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Sua primeira experiência, ainda no Sul, foi na Folha da Manhã, onde permaneceu por três anos. Depois que se formou, passou cinco anos viajando pelo mundo e para se sustentar, mandava matérias para o Jornal da Tarde, em São Paulo. Trabalhou como repórter para as revistas “Veja” e “IstoÉ” atuando como correspondente internacional na cidade de Nova Iorque. Barcellos ainda trabalhou em programas tradicionais como o Jornal Nacional, Fantástico, Globo Repórter e, mais recentemente, o Profissão Repórter.
Caco ganhou notoriedade como autor de reportagens investigativas em defesa dos direitos humanos, como é o caso de Rota 66, um livro-reportagem com tons de denúncia. Não visa denunciar somente a “história da polícia que mata“ e como essas mortes aconteciam e eram escondidas, mas também a história daqueles que eram injustiçados. O livro pode ser caracterizado como um livro-reportagem, pois trata de fatos reais utilizando o princípio da produção de notícias com nuances literárias.
O livro possui aproximadamente 300 páginas e é dividido em três partes: Rota 66 (9 capítulos), Os Matadores (7 capítulos) e Os Inocentes (7 capítulos). Com apurações detalhadas e tentando ao máximo mostrar todos os lados das histórias, Caco relata os assassinatos realizados pela polícia militar no período da ditadura, encontrando o racismo e a desigualdade social como motivo para os policiais militares cometerem crimes contra pessoas inocentes.
O fato dos anos irem passando e os mesmos crimes continuarem acontecendo do mesmo jeito, apenas com vítimas diferentes, faz com que o leitor fique preso na história, imaginando hipóteses sobre o que ocorrerá no desfecho da narrativa.
Na primeira parte do livro, Caco Barcellos relata a história da Rota 66, começando pela descrição da vida dos três jovens perseguidos, suas rotinas, relações com familiares e amigos, lazer e conflitos com outros garotos da região. Um fato que chama atenção são as características dos mesmos, dois maiores de idade, 19 e 21, outro, inclusive o motorista da fuga, menor, com 17, ambos de classe social média alta e brancos. Pessoas raras a serem “caçadas” pela polícia.
Em 1970 a ROTA – Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar - foi criada no período do regime militar, com uma única e exclusiva função: reprimir as ações guerrilheiras de assaltos a bancos. Tempos passaram e dedicaram-se ao combate da violência urbana. “Ao disparar a metralhadora contra o Fusca azul, eles nada sabem a respeito da vida dos três rapazes. ” (BARCELLOS, 2012, p.44). Desde então, surge um interesse em Caco para traçar um perfil das vítimas, saber mais sobre suas histórias de vida, suas fichas e classes sociais. Pesquisou, ouviu, estudou diversos lados e constatou algumas fontes. Fez jus ao seu dom de jornalista investigativo, mas sempre com sua posição, sendo contra os atos da Rota, mostrando uma verdade fora da realidade, sem passar por toda a “maquiagem” e transformação da mídia.
Caco Barcellos sempre busca a raiz da notícia, formulando suas próprias opiniões. Com isso, teve a oportunidade de participar de algumas ações policiais, conhecendo então, o outro lado da história.
O fato de usar o caso “Rota 66” para iniciar o seu livro-reportagem é muito interessante, pois tira o cidadão comum do pensamento padrão, “isso nunca vai acontecer comigo”.
“Ao começar a fazer este livro, meu objetivo era denunciar a ação de matadores oficiais contra os civis envolvidos em crimes na cidade. O balanço final do meu trabalho, em junho de 92, acabou surpreendendo a mim mesmo. Os criminosos não representam a maioria entre as pessoas mortas pelos policiais militares. O resultado da minha investigação, que abrange o período de 22 anos de ação dos matadores, mostra que maioria parte dos civis mortos pela PM de São Paulo é constituída pelo cidadão comum que nunca praticou um crime: o inocente. ” (BARCELLOS, 2012, p.285).
No decorrer da história, de cada capítulo, é apresentado relatos de crimes bárbaros, cenas do crime forjadas, morte de inocentes, ações violentas de combate ao crime, a quantidade de policiais desnecessárias numa ação, agressões, mentiras, revolta e muita dor.
Caco, por meio da criação de um Banco de Dados, investiga minuciosamente suas alegações. Usa e abusa de detalhes, o que deixa a narrativa um pouco cansativa, descrevendo a vida, rotina e pensamentos das vítimas. No entanto, o que deixou a desejar foi a falta da descrição dos policiais envolvidos, pois são características sucintas, sem muitos prolongamentos, fazendo com que os leitores tenham somente uma ideia superficial da figura policial da época.
O autor mostra seu poder de persuasão e solidariedade com as vítimas injustiçadas, nas seguintes passagens:
“Como meus pedidos de pesquisas nos arquivos da PM eram sempre negados, sou obrigado a tomar o caminho da investigação. Opto pela ideia que julgo mais racional: a criação de um Banco de Dados sobre os indivíduos mortos durante o patrulhamento da cidade” (BARCELLOS, 2012, p.73).
“(...) procurei discretamente me misturar aos amigos e parentes, fiéis de uma igreja evangélica. Passei a acompanhar a sua recuperação nas semanas seguintes, com visitas diárias ao hospital, sem me identificar como repórter (...)” (BARCELLOS, 2012, p.294-295).
Durante a leitura, o lado humano do autor prevalece na narrativa e não apenas seu lado profissional, jornalista. Corre riscos, se faz presente em órgãos públicos, IMLS, cartórios, delegacias, hospitais e comunidades. Riscos que poderiam lhe causar problemas pessoais e/ou psicológicos. Não se sabe se isso aconteceu, já que a preferência é dada às retaliações vividas por outros.
O mais revoltante é que, por meio de seus relatos, é possível identificar o esquema de politicagem quando revela uma polícia que acoberta crimes, eleva a moral dos matadores com premiações e uma imprensa totalmente manipulada, dando ênfase a falsas informações, dificultando assim a punição dos matadores – mesmo quando comprovados os crimes de execução. Os desfechos injustos de crimes (pequenos furtos) nos fazem ter uma noção da falta de humanidade existente de ambas as partes.
Apesar da grande quantidade de informações obtidas pelo jornalista, chegou-se a um ponto que não eram mais suficientes para dar peso e credibilidade a sua posição. Então ele recorre a outras tentativas, como provas visuais e audiovisuais.
Com um final surpreendente, em um dos episódios de tortura da PM – Polícia Militar, discretamente o câmera, aliado de Caco, está posicionado, filmando toda a negligência dos policiais com a vítima, que logo em seguida é divulgado nos veículos de informação e como consequência, os policiais são detidos.
Seu estudo e esforço como desfecho final dessa história provam para nós, leitores, o abuso de poder, de negligências e injustiças, um verdadeiro encontro com a realidade, que nos faz perceber que não devemos acreditar em tudo o que ouvimos ou lemos por maior que seja a credibilidade do veículo de informação que estamos utilizando.
Precisamos nos conscientizar da importância de analisar, investigar, coletar e divulgar acontecimentos. Para entender o problema, acreditamos que conhecer as suas origens deve ser o pontapé inicial para uma possível repressão.
Texto feito por: Jhonathan Pereira, Luiza Pietra Arraya e Rafaela Ponchirolli.
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